BRASÍLIA — Depois de ter sido o alvo preferencial das ruas no último domingo, quando protestos espalhados por todo o país exigiram o fim da corrupção e apoiaram as investigações da Operação Lava-Jato, o senador Renan Calheiros enfrenta agora uma perda política simbólica grave, sendo afastado por liminar da presidência do Senado. A Rede entrou nesta segunda-feira com o pedido de afastamento, alegando que já existe uma maioria firmada no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) a favor da tese de que quem é réu não pode fazer parte da linha de sucessão do presidente da República - no caso, os presidentes da Câmara e do Senado e o presidente do STF. O pedido foi aceito pelo ministro Marco Aurélio e veio ao encontro da voz das ruas, impondo mais uma derrota a Renan. A liminar precisará ser ainda referendada pelo plenário do STF.
No lugar de Renan, assumirá a Presidência do Senado o petista Jorge Viana. Segundo o Blog do colunista Lauro Jardim, caso o plenário do STF confirme a decisão liminar, Jorge Viana está disposto a convocar imediatamente uma nova eleição para a presidência do Senado. Segundo o petista, diante da instabilidade política por que passa o país, o Senado não pode prescindir de um presidente com total legitimidade.
Na decisão de afastar Renan do cargo, o ministro Marco Aurélio explicou que não afastou o senador do mandato, apenas da Presidência do Senado. Renan planajeva colocar para votação no plenário amanhã o projeto sobre abuso de autoridade, bastante questionado por juízes e membros do Ministério Público.
"Defiro a liminar pleiteada. Faço-o para afastar não do exercício do mandato de Senador, outorgado pelo povo alagoano, mas do cargo de Presidente do Senado o senador Renan Calheiros. Com a urgência que o caso requer, deem cumprimento, por mandado, sob as penas da Lei, a esta decisão".
Pela regra constitucional, na ausência do presidente da República e do vice, os substitutos são os presidentes da Câmara, do Senado e do STF, nessa ordem. Na semana passada, o tribunal aceitou denúncia contra Renan e ele foi transformado em réu em uma ação penal por peculato. A íntegra da decisão ainda não foi divulgada.
Em uma decisão de seis páginas, o ministro narra o julgamento da ação que questiona se réus podem ocupar cargos na linha sucessória da Presidência da República. Lembra que já há maioria no STF para proibir réus de ocuparem as Presidências da Câmara e do Senado, mas o julgamento foi interrompido por um pedido de vista do ministro Toffoli e que Renan é réu no Supremo.
“Mesmo diante da maioria absoluta já formada na arguição de descumprimento de preceito fundamental e réu, o Senador continua na cadeira de Presidente do Senado, ensejando manifestações de toda ordem, a comprometerem a segurança jurídica”, diz o ministro Marco Aurélio.
“Urge providência, não para concluir o julgamento de fundo, atribuição do Plenário, mas para implementar medida acauteladora, forte nas premissas do voto que prolatei, nos cinco votos no mesmo sentido, ou seja, na maioria absoluta já formada, bem como no risco de continuar, na linha de substituição do Presidente da República, réu, assim qualificado por decisão do Supremo”, acrescenta o ministro do Supremo.
Em novembro, o STF começou a julgar ação apresentada pela própria Rede que questiona se um réu pode estar na linha sucessória da Presidência. Cinco ministros do Supremo seguiram à época o entendimento de Marco Aurélio, relator da ação, de que um parlamentar que é alvo de ação penal não pode ser presidente da Câmara ou presidente do Senado porque é inerente ao cargo deles eventualmente ter que assumir a Presidência. O julgamento não foi concluído porque o ministro Dias Toffoli pediu vista e não há data para ser retomado.
O STF abriu na semana passada ação penal para investigar Renan por peculato — ou seja, desviar bem público em proveito particular. O processo apura se a empreiteira Mendes Junior pagou pensão alimentícia à jornalista Mônica Veloso, com quem o parlamentar tem uma filha. O escândalo eclodiu em 2007 e, na época, levou à renúncia de Renan da presidência do Senado. As investigações revelaram que o parlamentar não tinha dinheiro suficiente para pagar a pensão. Renan teria apresentado documentos falsos para comprovar que tinha condições de arcar com a despesa. Além desse caso, o peemedebista responde a outros onze inquéritos no STF, sendo oito decorrentes da Operação Lava-Jato.
Dos três crimes pelos quais Renan foi denunciado, os ministros foram unânimes na decisão de arquivar um deles por prescrição. Não há mais como punir o parlamentar por falsidade ideológica de documento particular, porque já se passaram muitos anos dos fatos. Em relação ao crime de falsidade ideológica de documento público, o STF declarou, por oito votos a três, que a denúncia explicou exatamente qual documento tinha sido fraudado. Portanto, não haveria motivo mínimo para prosseguir com a investigação.
Restou apenas o crime de peculato. Em 2005, Renan teria simulado um empréstimo com a locadora de carros Costa Dourada. Segundo a denúncia, o dinheiro extra na conta bancária serviria para comprovar que ele tinha renda suficiente para pagar do próprio bolso a pensão à filha. Além disso, Renan teria usado mais da metade da verba indenizatória do Senado, de R$ 12 mil por mês à época, para pagar a mesma empresa. Teriam sido sete pagamentos de R$ 6,4 mil. Segundo a denúncia, o contrato também era fictício, porque não ficou comprovado o fornecimento dos carros em contrapartida. Os repasses à locadora teriam sido realizados entre janeiro e julho de 2005.
*Estagiário, sob supervisão de Francisco Leali
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